
Na virada da década de 80 para 90, aconteceu um fato histórico (que ninguém mais lembra) no meu bairro. Um louco varrido comprou uma mansão e a transformou num bar. Você podia andar pela casa, piscina e jardim, onde tinham mesas para os clientes, era o “point” do momento, todo mundo ia.
Na época passava uma telenovela na extinta Rede Manchete, baseada na história dos alemães que viviam no sul do Brasil no tempo da quebra da bolsa de valores de Nova York, pouco mais de uma década antes da Segunda Grande Guerra Mundial. A telenovela chamava-se de “Kananga do Japão”, daí, no meu bairro foi fundado o “Kananga do Zecão” que não era um bordel como na novela, mas tava bom demais, tão bom que sempre depois de meia noite algum bebum caía de roupa e tudo na piscina, já era tradição.
Numa dessas vezes, estava eu sozinho curtindo meus primeiros anos de adulto, era maravilhoso ter liberdade total, beber o quanto quisesse pagar com meu próprio dinheiro e não dever nada a ninguém. Foi então que um amigo, que acho que nem mora mais no Brasil, colocou a mão em meu ombro e disse:
- Acho que você já bebeu demais, vá pra casa!
Na mesma hora pensei na piscina e resolvi ir embora, nunca fui de discutir mesmo. Então procurei Zecão dono do bar, paguei a conta e saí. Andei devagar observado as estrelas, era uma sexta-feira e no outro dia iria mergulhar no boqueirão a 1 km de distância da costa da praia, o vento era nordeste e tudo indicava que ia ser perfeito. Passei por uns becos que costumava usar como atalho pra chegar à minha casa, cruzei com um vizinho que cumprimentei e pensei o que ele estaria fazendo tão tarde na rua, pois já devia passar das duas da manhã. Quando cheguei a minha casa as coisas começaram a ficar realmente estranhas, pois ao lado havia um pequeno terreno baldio com uma árvore e tinham crianças brincando de ciranda em volta dela. Todas de branquinho, apenas sorriram pra mim quando me viram, e eu sorri de volta e pulei o muro de casa (costume da época, não gostava de abrir o portão).
Derrepente já estava de dia, as crianças haviam desaparecido, olhei para o céu e vi as nuvens se movendo rapidamente no que seria um vento sul. Foi então que pensei, estaria sonhando? Resolvi subir as escadas que levava para o terraço, foi quando tive uma visão onírica, no terraço havia uma outra escada que não levava a lugar algum, simplesmente os degraus eram cobertos de espinhos grandes e retorcidos que impossibilitavam a subida e no topo estava toda de branco, uma namoradinha que eu tinha na época, seus loiros e enormes cabelos balançavam ao vento e seu rosto tinha um ar malicioso.
Pensei: Porra! Até aqui no sonho você faz jogo duro? Apontei o dedo na cara dela e disse: vá à merda! E virei às costas, voltei a pensar no meu sonho, será que podia voar? Então subi no muro do terraço e olhei pra baixo e pensei: vou pular e ver o que acontece! Pulei, senti o vento no meu rosto e no meio da queda eu lembrei que alguém disse que se agente morrer no sonho, morre de verdade...
Acordei na cama na mesma posição que tinha caído do terraço, eu realmente tinha sonhado tudo aquilo, o que eu não sei até hoje, foi a partir de que horas começou o sonho e terminou a realidade.
Autor: Júlio César



